Um dos desenhos animados de maior sucesso entre as crianças atualmente tem uma curiosidade confortante: Depois de derrotar os vilões - o que todas as vezes implica em destruir grande parte de Paris - a super-heroína Ladybug (joaninha) arremessa para o alto um talismã, chamado Miraculous, e tudo volta ao normal - coisas quebradas se "desquebram", coisas destruídas se reconstroem e até as mentiras são esquecidas.
Pois parece que, acaso alguém consiga viajar no tempo, o milagre da Lady Bug poderá acontecer de fato, com a vida real se rearranjando para consertar qualquer problema que o viajante no tempo tenha causado.
Em outras palavras, pode não existir paradoxo na viagem no tempo, como aquele que pergunta o que aconteceria se você voltasse no tempo e matasse seu avô, impedindo sua linhagem e, portanto, sua própria existência - se você voltar no tempo e, por alguma razão, em vez de querer dar um abraço no vovô, querer matá-lo, ao voltar ao presente a própria realidade anulará suas ações e tudo voltará ao normal.
Esta é a conclusão de Bin Yan e Nikolai Sinitsyn, do Laboratório Nacional Los Alamos, nos EUA.
Usando um computador quântico para simular viagens no tempo, os dois pesquisadores demonstraram que, no reino quântico, nada que você faça interferirá no presente. Na pesquisa, informações - qubits ou bits quânticos - fazem uma viagem no tempo simulada, voltando para o passado - sim, em experimentos de física quântica é possível inverter a seta do tempo.
Ao chegar ao passado, um dos qubits é então fortemente danificado por um agente. Surpreendentemente, quando todos os qubits retornam ao "presente", eles parecem praticamente inalterados, como se a realidade se autocurasse.
Mas os filhos dos dois físicos não devem gostar do "efeito joaninha", aquele da Ladybug: eles preferem "efeito borboleta", uma referência à proposta de que, voltando ao passado, simplesmente roçar em uma borboleta alteraria totalmente o fluxo temporal, mudando a história.
"Em um computador quântico, não há problema em simular a evolução reversa no tempo ou em executar um processo ao contrário, rumo ao passado," explica Sinitsyn. "Então, podemos realmente ver o que acontece com um mundo quântico complexo se viajarmos no tempo, adicionarmos pequenos danos e retornarmos. Nós descobrimos que nosso mundo sobrevive, o que significa que não há efeito borboleta na mecânica quântica".
Esse efeito de autoconserto da realidade não é mera curiosidade e menos ainda ficção: Ele tem potenciais aplicações em hardware de ocultação de informações e teste de dispositivos de informação quântica - as informações podem ser ocultadas por um computador quântico convertendo o estado inicial em um estado fortemente entrelaçado.
"Nós descobrimos que, mesmo que um invasor realize medições que danifiquem o estado [dos qubits] no estado fortemente emaranhado, ainda podemos recuperar facilmente as informações úteis, porque esse dano não é amplificado por um processo de decodificação," disse Yan. "Isso justifica conversas sobre a criação de hardware quântico que será usado para ocultar informações".
A descoberta também pode ser usada para testar se um processador quântico está, de fato, trabalhando segundo princípios quânticos. Como o recém-descoberto "não-efeito borboleta" é puramente quântico, se um processador executar a simulação e apresentar esse efeito de autoconserto, então ele deve ser um processador quântico autêntico.
No experimento da equipe, realizado em um IBM-Q, a agente favorita dos físicos quânticos, Alice, prepara um de seus qubits no momento presente e o manda numa reversão temporal no computador quântico. No passado, um intruso - Bob, outro ator favorito dos físicos - mede o qubit de Alice. Essa ação perturba o qubit e destrói todas as suas correlações quânticas com o resto do mundo. Em seguida, o sistema segue a linha normal do tempo e avança para o tempo presente.
O pequeno dano causado por Bob ao estado do qubit e todas as suas correlações deveriam ser rapidamente ampliadas durante a evolução no tempo, de forma que Alice deveria ser incapaz de recuperar suas informações quando o qubit alcançá-la novamente em seu tempo.
Mas não foi isso que aconteceu. Yan e Sinitsyn descobriram que a maioria das informações locais do presente estava oculta no passado profundo na forma de correlações essencialmente quânticas que não podiam ser danificadas por pequenas violações. Assim, as informações retornaram ao qubit de Alice sem muitos danos, apesar da interferência de Bob.
Contra-intuitivamente, para viagens mais profundas ao passado e para "mundos" maiores, as informações finais de Alice retornam para ela ainda menos danificadas.
"Descobrimos que a noção de caos na física clássica e na mecânica quântica deve ser entendida de maneira diferente," disse Sinitsyn - lembrando que o efeito borboleta é um termo que se refere à dependência de um sistema das condições iniciais dentro da teoria do caos.
Créditos: Inovação Tecnológica