quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Novo paradoxo quântico revela contradições em nossa visão do Universo


Nós nos acostumamos com as explicações que a ciência nos dá sobre a natureza, frequentemente considerando-as como explicações definitivas. Mas não seja enganado pelas aparências: Poucas das nossas teorias - se é que alguma delas - pode ser considerada "definitiva". Afinal, além de extremamente jovem, a ciência é um edifício em permanente construção, e nossa compreensão da natureza está constantemente sendo "ajustada" para dar conta dos novos saberes. Kok-Wei Bong e colegas da Universidade Griffith, na Austrália, acabam de nos dar mais exemplo cabal dessa "insustentável fluidez do saber": Eles demonstraram que, quando se trata de certas teorias longamente aceitas sobre a natureza, "alguma coisa tem que ceder". A equipe de físicos descobriu um novo paradoxo envolvendo a mecânica quântica que estabelece que, entre três "crenças", deveremos abrir mão de pelo menos uma delas porque, juntas, elas não se sustentam. Apesar de excepcionalmente eficaz para predizer o que observamos em objetos minúsculos, como átomos, a aplicação da teoria quântica em escalas muito maiores do que os átomos - em particular para os observadores que fazem as medições - levanta questões conceituais difíceis. Quem começa explicando a situação e o paradoxo que ela engendra é o professor Eric Cavalcanti, um dos descobridores do novo paradoxo. "O paradoxo significa que, se a teoria quântica funcionar para descrever os observadores, os cientistas terão que desistir de uma de três suposições muito estimadas sobre o mundo. "A primeira hipótese é que, quando é feita uma medição, o resultado observado é um evento real e único no mundo. Essa suposição exclui, por exemplo, a ideia de que o Universo possa se dividir, com diferentes resultados sendo observados em diferentes universos paralelos. "O segundo pressuposto é que os cenários experimentais podem ser escolhidos livremente, permitindo-nos realizar testes aleatórios. E o terceiro pressuposto é que, uma vez que tal escolha é feita, sua influência não pode se espalhar no Universo mais rápido do que a luz. "Cada uma dessas suposições fundamentais parece inteiramente razoável e é amplamente aceita. No entanto, também é amplamente aceito que os experimentos quânticos podem ser escalonados para sistemas maiores, até mesmo ao nível de observadores. Mas nós demonstramos que uma dessas crenças amplamente aceitas deve estar errada! E abandonar qualquer uma delas tem consequências de longo alcance para nossa compreensão do mundo," disse Cavalcanti.

A equipe estabeleceu o paradoxo analisando um cenário com partículas quânticas entrelaçadas bem separadas, combinadas com um "observador" quântico - um sistema quântico que pode ser manipulado e medido de fora, mas que pode ele mesmo fazer medições em uma partícula. "Com base nas três hipóteses fundamentais, nós determinamos matematicamente os limites de quais resultados experimentais são possíveis nesse cenário. Mas a teoria quântica, quando aplicada aos observadores, prevê resultados que violam esses limites. Na verdade, nós já fizemos um experimento de prova de conceito usando fótons entrelaçados (partículas de luz). E encontramos uma violação exatamente como a teoria quântica previu. "Mas nosso 'observador' tinha um cérebro muito pequeno, por assim dizer. Ele tem apenas dois estados de memória, que são implementados como dois caminhos diferentes para um fóton. É por isso que o chamamos de experimento de prova de princípio, não de uma demonstração conclusiva de que um dos três pressupostos fundamentais em nosso paradoxo deve estar errado," ponderou Tischler. "Para uma implementação mais definitiva do paradoxo, nosso experimento onírico [experimento mental] é aquele em que o observador quântico é um programa de inteligência artificial de nível humano rodando em um computador quântico gigantesco. "Esse seria um teste bastante convincente para saber se a teoria quântica falha para os observadores ou se uma das três suposições fundamentais é falsa. Mas isso provavelmente está a décadas de distância [de poder ser realizado experimentalmente]", acrescentou o professor Howard Wiseman.

Mas o que são algumas poucas décadas de espera para esclarecer questões que vão muito além de um problema estrito de mecânica quântica, alcançando debates feitos há milênios em nossa tradição cultural? Afinal, quem não se interessa em saber se existem mesmo universos paralelos, com outros "nós" seguindo histórias pessoais totalmente diferentes, e com novas histórias emergindo a cada vez que tomamos uma decisão? Ou se nossa capacidade de influenciar a realidade é tamanha que podemos mudar as coisas por simplesmente observá-las, deixando o efeito borboleta no chinelo? Ou ainda, se nossas decisões se espalham pela realidade instantaneamente, como parece acontecer com as influências instantâneas compartilhadas pelas partículas ligadas pelo entrelaçamento quântico? "Há muito se reconhece que os computadores quânticos irão revolucionar nossa capacidade de resolver problemas computacionais difíceis. "O que não percebemos até começarmos esta pesquisa é que eles também podem ajudar a responder complicados problemas filosóficos - a natureza do mundo físico, o mundo mental e seu relacionamento," disse o professor Wiseman.

Créditos: Inovação Tecnológica

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